PELA QUALIDADE SOCIAL DA ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA


PELA QUALIDADE SOCIAL DA ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA

Por Joel Reis



Entendemos que a realidade social é construída socialmente, isto é, ela não é preexistente, mas é criada pela ação dos grupos sociais, mediante contínuas interações, marcadas por ações e reações, dúvidas e certezas, objetividades e subjetividades, ordens e desordens. Inevitavelmente, a realidade é marcada pela complexidade de dimensões e movimentos expressos por meio de contradições, tensões e incertezas, cuja superação prepara o contexto para novos patamares mais abrangentes e significativos desses aspectos.

A partir desse entendimento a realidade não seria explicável, nem adequadamente abordada, tendo como ponto de partida um enfoque linear e fragmentado e ações localizadas, mecânicas e excludentes. Daí o porquê da necessidade de uma visão e ações abrangentes que considere tal compreensão em todos os aspectos interferentes numa dada situação, em relação a seu contexto.

Tendo essa compreensão por base é que entendemos que a questão da qualidade do ensino e da qualidade social do ensino, em decorrência de sua complexidade, e pela multiplicidade de fatores e processos nelas intercorrentes, demandam uma orientação global, abrangente e interativa, com visão de longo prazo, em superação à localizada, descontextualizada e imediatista, identificada nas ações situacionais e de caráter meramente ativista, como são apresentados e discutidos nos artigos de Dourado e Oliveira (2009) - "A qualidade da educação: perspectivas e desafios" - e Silva (2009) - "Qualidade social da educação pública: algumas aproximações".

Como bem apresenta os artigos citados, ao longo da história de nossa educação, os esforços para a melhoria da qualidade do ensino têm privilegiado ações que focalizam, de acordo com a prioridade definida à época, ora a metodologia do ensino; ora o domínio dos conteúdos pelos professores e/ou sua capacidade docente; ora a melhoria das condições físicas e materiais da escola; ora as reformas do currículo em seu aspecto formal; ora os processos educacionais; ora a aprendizagem; ora o ensino; ora a avaliação. Ou seja, dirigentes de sistemas de ensino, desde o âmbito federal, até os municipais, passando pelos estaduais, elegem áreas consideradas prioritárias, com base nas exigências do mercado, e estabelecem as políticas sociais da educação.

Observam-se casos em que, embora existam instrumentos e condições para orientar a realização de ensino de qualidade, estes se tornam ineficazes por falta de ações articuladas e conjuntas. Por exemplo, há escolas com excelentes condições físicas e materiais, em que os alunos vivenciam uma escolarização conservadora; outras em que o trabalho de professores competentes perde-se no conjunto de ações pedagógicas desarticuladas; outras que, embora tenham uma proposta pedagógica avançada e articulada, não consegue traduzi-la em ações efetivas, por falta de sinergia coletiva e comprometimento conjunto de seus profissionais.

Como é discutido em ambos os artigos anteriormente citados, falta o entendimento, para a promoção da qualidade da educação, uma visão global da escola como instituição social e uma percepção abrangente da teia de relações entre os vários componentes que delineiam a experiência educacional.

Do ponto de vista macro, verifica-se a necessidade de modificações sensíveis na organização e orientação da educação brasileira, com o propósito de que se promova no país, educação em nível de qualidade tal que este possa participar ativamente do processo de globalização da economia e internacionalização cultural; a fim de que o povo brasileiro não fique à margem do desenvolvimento, como também possa contribuir para o mesmo e usufruir desse movimento geral. Que todos possam ter experiências educacionais estimulantes e promotoras de seu desenvolvimento integral.

Ao nos determos, mas especificamente a cada um dos artigos mencionados temos que, com relação à "qualidade do ensino" e "qualidade social do ensino", Silva (2009) explica esses dois fenômenos a partir do entendimento da educação como uma prática social e um ato político, sendo a educação escolar uma prioridade, pois ela é um dos caminhos para a superação do distanciamento das classes sociais.

Já Dourado e Oliveira (2009) explicam esses fenômenos a partir das demandas e exigências sociais do momento histórico pelo qual se passa num dado momento ou época, isto é, a partir da compreensão dos embates e visões de mundo que se apresenta no cenário atual de estruturação do Estado, de rediscussão do papel da educação como direito social e como mercadoria.

Com referência ao que é preciso fazer para tornar a educação básica das escolas públicas em ensino de qualidade, Silva (2009) aponta que há dois conjuntos de determinantes que contribuem para a qualidade da educação: as condições socioeconômicas e culturais das famílias dos discentes, bem como as expectativas das famílias e dos alunos para com a escola e com a educação. As políticas públicas de educação; os projetos desenvolvidos na escola; a valorização e reconhecimento social dos docentes e demais trabalhadores da educação; a transformação dos espaços escolares em lugares de aprendizagens significativas e de vivências democráticas.

Dourado e Oliveira (2009) pontuam que a qualidade da educação envolve duas dimensões, a extra e a intraescolar, nas quais devem ser considerados os atores envolvidos no processo educacional, a dinâmica pedagógica (processos ensino-aprendizagem, os currículos, as expectativas de aprendizagem e os fatores extraescolares que interferem de forma direta ou indireta nos resultados educacionais).  Como se pode notar, os autores, tanto um como do outro artigo, não diferem muito, neste quesito.

Em termos de semelhanças e diferenças entre os conceitos trabalhados pelos autores, e as relações que estabelecem com as escolas públicas da educação básica, podemos apontar como semelhança a questão da complexidade que envolve o conceito de qualidade, bem como não ser ele um conceito fixo, pois vai depender do contexto e da época vivida. Outro ponto de igualdade é que a qualidade é um conceito histórico, que vai se alternando no tempo e no espaço em atendimento às demandas sociais.

Em termos de diferenças, o conceito de Silva (2009) prende-se mais as questões socioeconômicas, ou seja, a qualidade da educação está vinculada às exigências do mercado. Dourado & Oliveira (2009), de certo modo considera também esta variável, mas para os autores, a qualidade está atrelada aos sistemas de ensino (união, estados e municípios) e sua estruturação, em uma perspectiva de descentralização e desconcentração das ações educativas.

No tocante as relações com o ensino público, como abordado anteriormente, tanto Silva (2009) quanto Dourado & Oliveira (2009) são unânimes em dizer que a qualidade está atrelada a fatores internos e externos à escola.

Com relação à pergunta "a(s) escola(s) pública(s) que frequentei tinha(m) a qualidade de ensino destacada pelos autores?"

Se seguirmos o raciocínio dos autores dos artigos no que diz respeito à qualidade do ensino ser mutável em função das exigências de uma dada época, evidentemente, guardada as devidas proporções, que a qualidade do ensino era uma preocupação à época, e existia na mesma medida que existe atualmente, visto que os sistemas de ensino sempre tentaram vencer os desafios do desenvolvimento social por meio da educação.  


REFERÊNCIAS

DOURADO, L. F.; OLIVEIRA, J. F. A qualidade da Educação: Perspectivas e Desafios. Campinas: Caderno Cedes, nº 78, 2009. Disponível em: <https://repositorio.bc.ufg.br/bitstream/ri/12804/5/Artigo%20-Luiz%20Fernandes%20Dourado%20-%202009.pdf>. Acesso em: 15 out. 2016.

SILVA, M. A. da. Qualidade Social da Educação Pública: Algumas aproximações. Campinas: Caderno Cedes, nº 78, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v29n78/v29n78a05.pdf>. Acesso em: 15 out. 2016.





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